segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Bacharel em Oceanografia

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Se tudo der certo, eu me formo no primeiro semestre do ano que vem. Mal acredito que finalmente vou ter um diploma de bacharel em comunicação social pra pendurar na parede e chamar de meu. Orgulho da mamãe, mesmo que ela não entenda muito bem o que eu faço da vida. Como não vai ter festa, concordei em tirar foto em estúdio, com beca e canudo, que é pra ela colocar naquela estante da sala onde o quarto porta-retrato ainda espera pra ser preenchido. E vou até ganhar anel de formatura, olha que chique.

O problema é que em vez de estar feliz com essa conquista (definição do meu pai), eu só consigo pensar no alívio que vou sentir ao assinar a colação de grau — e a definição de alívio, colega, passa bem longe da de felicidade. Não sei você, mas quando eu saí do colégio ouvi dizer que a faculdade seria a melhor época da minha vida. Não sei você, mas eu tenho a impressão que mentiram pra mim. É verdade que fui a umas calouradas legais, conheci professores extremamente inteligentes e fiz amizades pra vida toda, mas a soma total resulta em uma aversão profunda. Os saudosistas que me perdoem, mas a universidade não me inspira nem um sopro de nostalgia.

Não interprete esse texto como um discurso intelectualóide, até porque meu histórico acadêmico coloca qualquer turma do fundão no chinelo, mas é que acho um absurdo concluir o curso sem nunca ter precisado de fato ler um livro. Eu disse pre-ci-sa-do porque é lógico que eu fiz a minha parte. Luna Clara & Apolo Onze, por exemplo, eu terminei durante uma aula de psicologia em que a professora analisava anúncios de acordo com uma teoria que segundo minha mãe, psicóloga, ninguém aplica nem em pesquisa, nem em consultório. Já Lavoura Arcaica eu fui obrigada a largar no meio de um seminário de marketing pra alguma coisa porque aquela escrita difícil não descia em meio aos berros de um professor que pregava o fim da Rede Globo.

Os mais chatos que eu (sim, eles existem) vão argumentar que universidade pública é assim mesmo: o aluno que faz o curso, tem que se virar e correr atrás. Discurso bonito. O problema, amigão, é que o Brasil (a.k.a eu e você) gasta em média R$15 mil ao ano com cada aluno do ensino superior. Significa que uma graduação custa aos cofres públicos cerca de R$75 mil. Agora imagine você o estrago que dá pra fazer com esse dinheiro na livraria mais próxima? É, eu também sinto um aperto no coração.

Torço sinceramente pela galera nova que está tentando dar uma cara bacana ao departamento, mas como membro da minha geração de concluíntes, não posso recomendar o curso a ninguém. Aos aspirantes a atendimentos, planejadores, criativos e mídias, sugiro uma alternativa um pouquinho radical: prestem vestibular pra filosofia, história da arte, ciências políticas, sociologia, economia, letras, administração ou museologia. Tenho a impressão de que vai agregar muito mais do que quatro cadeiras de redação publicitária que nunca vão mencionar esse tal de Eugenio Mohallem.
 
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12 comentários:

Nathália

As festas da minhas formatura aconteceram mês passado e toda minha família achou muito estranho a falta de choro, a falta de comemoração e o excesso de vodca. Vou pedir pra eles lerem esse texto. Vai ajudar muito.

Diogo Mendonça

Faço parte de um time que chegou na faculdade esperando o pior. "Lá só tem drogados e orgia. Não vai ter aula, não vai ter cadeira. Não vai ter nada". Era essa a visão que tinha do centro de artes. Me surpreendi: tinham os drogados, mas eles são gente boa(gente muito boa por sinal). Não tem orgia(você taradinho, desista).
Tem aula. Mas, aula também cabe uma definição. Ter aula por ter um professor que está na sua frente falando algo ou jogando powerpoint não é ter uma aula onde um professor sabe ensinar você como trabalhar.

O tempo foi passando e o saco foi enchendo. Cadê? Quando eu vou aprender a ser publicitário. Não sei o que quero ser. Quero ser redator, diretor de arte ou diretor de VTs. Ah, mas não temos as cadeiras de DA e tem uma, apenas uma, cadeira de produção audiovisual, lá no fim do curso, quando todo mundo já tá estagiando.

A falta de organização reina, impera. Soberana. Ah, mas o curso tá mudando(e tá mesmo), mas agora eu já tô me formando. O aluno tem que correr atrás sim, mas o aluno não pode fazer tudo. Se for pra correr atrás sozinho não precisamos de faculdade, de vestibular.

No fim o que levamos são as pessoas, os amigos e os contatos mesmo. Porque no mais queremos é esquecer várias coisas.

Nunca senti que tinha alguém gastando R$ 15 mil em minha educação. Nunca vi esse retorno. Seja por um copo d'água, um banheiro limpo(e inteiro) ou em recursos para estudo.

Espero realmente que o curso mude, que melhore. Os melhores profissionais só saiam de lá porque não existiam concorrentes. Agora, meu amigo, os tempos são outros. E, infelizmente, a UFPE parou no tempo.

Rique

Verdades inconvenientes.
O que falar das 5 cadeiras de redação e nunca termos ouvido em Mohallem?
Ou o fato de não ter NENHUMA cadeira de Direção de Arte.
Ou ainda termos que usar um laboratório com windows 98 pra aprender a usar power point e excel?
É, a gente aprende mesmo é com os colegas. Que viram amigos.

Talvez seja esse "aprender na marra", esse "correr atrás", que forme pessoas tão brilhantes como você.

Ah, parabéns pela coragem de vir aqui e falar isso tudo. Não vai faltar gente pra concordar.

Marcela Egito

é.. eu tb tenho aversão. Tanto que nem gastar dinheiro em anel rolou. Nem foto com canudo, nem nada. Tu ainda foi até paciente. hehe =P
E tb não sinto saudade. Acho que o pior da minha época era o calor da federal. Meu deus. E voltar no ônibus fedido pela Br, passando mal de fome? Cochilando para não sentir a tontura? Não, thanks. Realmente...

Não Li luna Clara na aula. Mas li em SP, faltando 2 meses de aula para estagiar em sp e compensar com trabalhos. Enfim. Coisas da Federal. As pessoas, sim, essas valem a pena lembrar.

Fora isso, bom texto. Muito bom. Palmas. Beijo!

igor

não estudei na ufpe, mas tenho a mesma sensação. deve ser mais grave, né?
massa o texto.

Carol Burgo

Adorei o texto e super me identifiquei! Mesmo tendo me formado em faculdade particular, desde o 3º período eu percebi que nada daquilo ia contribuir pra minha formação profissional. Sou dir. de arte e nunca sequer tive uma cadeira de DA. Claro que as condições físicas das faculdades particulares são um pouco melhores, mas a qualidade do curso em si é a mesma merda pra todos os lados. Aliás, quando, nesta vida, alguém precisa de 4 anos numa faculdade pra cursar publicidade? E grandes merdas ter um canudo em comunicação né? Já que a profissão não é regulamentada nem exige sequer curso superior.

Parabéns pelo texto excelente Gabriela!! :)

Henrique Zirpoli

"Tudo o que você queria dizer sobre o curso de publicidade e ninguém teve coragem de escrever."
Massa o texto, Gabi. De vez em quando até que tu leva jeito pra essas coisas. :P
Bjo pra tu

will Santos

Lá é bem legal pra quem quer ser pesquisador em comunicação.

Miguel Solano

Texto genial e concordo em quase tudo que li.

Natália Pinho

Ótimo texto!

Danilo Portela

Eu tava até pensando em fazer vestibular pra publicidade. Agora já não sei mais.

Blog do Elias Loprete

Cara gostei muito do texto.Infelizmente esse modêlo(retrogado) acadêmico nos engole. mas creio que isso ta mudando, a net tem sido fundamental pra isso, creio que a sociedade( uma grande parte), com essa coisa toda de colaboração está criando um novo modêlo de aprendizado, nós precisamos disso.Espero que eu ainda possa contemplar essa mudança e ver qual é o resultado dessa coisa toda

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